sábado, 12 de março de 2011

"Temos de reagir com uma ação militante"

É uma entrevista longa, mas vale a pena a leitura.

Aborda a necessidade e os ataques aos sindicatos e  a obrigatoriedade do 12º ano de escolaridade.

Já gostei mais dos sindicatos, mas respeito as opiniões. E como contratado sinto-me esquecido...

"Temos de reagir com uma ação militante"
Andreia Lobo -Educare

Abel Macedo, coordenador do Sindicato dos Professores do Norte (SPN) identifica nesta entrevista os temas mais urgentes da ação sindical. Responde ainda à pergunta: Porque os professores precisam de um sindicato?

Às posições mais conhecidas contra "a lógica hierárquica" do modelo de gestão das escolas, "decisiva no plano político", Abel Macedo, coordenador do Sindicato dos Professores do Norte (SPN), acrescenta outras reivindicações, como a necessidade de "ver que currículo se deve pensar para uma escola com 12 anos de duração para todos os alunos".

Durante o 7.º Congresso dos Professores do Norte, realizado em fevereiro, em Guimarães, o EDUCARE.PT entrevistou o sindicalista sobre os pontos-chave da agenda reivindicativa daquela organização.

Abel Macedo insiste em denunciar o que diz ser uma "ofensiva" governamental ao exercício da atividade sindical. "Os sindicatos são olhados num plano de desvalorização do seu papel na sociedade", reconhece o sindicalista. Como resposta, diz, importa "reagir com uma ação militante".

Mas a militância também pode estar em risco. No quadro da redução de efetivos sindicais, Abel Macedo adverte: "Vivemos com mais dificuldades para alimentar a relação de proximidade das escolas porque isso não se consegue quando não há dirigentes disponíveis para o fazer."

"O Governo não só agiu no sentido de diminuir a capacidade de reação dos sindicatos e das suas direções, como também do exercício do direito de atividade sindical que cada professor tem", assegura o coordenador do SPN.

Acresce o fenómeno da dessindicalização, "por motivos económicos", que a estatística do SPN tem registado nos últimos anos. Citando John Dewey (1859-1952), um dos fundadores do pragmatismo filosófico, Abel Macedo reafirma a importância de os professores se mobilizarem para organizações sindicais que os representem. E à pergunta: Porque os professores precisam de um sindicato, responde: "Há que justificar por que razão não se está e não encontrar justificações para se estar filiado num sindicato."

"Seria importante ver que currículo se deve pensar para uma escola com 12 anos de duração para todos os alunos."

EDUCARE.PT (E): Um dos temas em debate é a escolaridade obrigatória de 12 anos. Qual é a posição do SPN nesta matéria?

Abel Macedo (AM): Portugal é um dos apenas quatro países da União Europeia que têm uma escolaridade obrigatória de 12 anos. E uma questão que se coloca é porquê esta necessidade? Quando outras democracias mais antigas não colocaram esta exigência, mas em alternativa colocam a questão da frequência da escolaridade de 12 anos. Espanha, por exemplo, não a tem. E isto têm de questionar os professores, educadores e sindicatos.

Como é que organizamos toda a escola para responder a esta obrigatoriedade? Seria importante ver que currículo se deve pensar para uma escola com 12 anos de duração para todos os alunos. Esta discussão não está feita, por isso, apresentamos aqui uma possibilidade para uma nova organização dos ciclos de estudo [dois ciclos de seis anos, subdivididos em ciclos de três, sendo que no 1.º ciclo os três primeiros anos assentariam na monodocência e os segundos três numa organização por áreas de estudo].

E: Vale a pena uma escolaridade obrigatória de 12 anos, com taxas de abandono elevadas?

AM: A questão é essa. O abandono e o insucesso escolar já eram grandes, antes desta obrigatoriedade, agora não se acautela essa parte decisiva para se pensar mais largo. O desafio que se coloca aqui é o de repensar todo o currículo para uma lógica de escolaridade que é outra.

E: Para o SPN, continua atual a questão da gestão das escolas, que já foi muito debatida no anterior congresso, em 2003?

AM: Andamos há anos a produzir informação sobre essa questão, mas ela continua atualíssima. E é decisiva no plano político, pela maneira como se está a pensar que a escola se organiza para responder a todos os desafios a partir de uma lógica hierárquica e com uma pessoa só a responder sempre para cima.

Usando uma expressão que não é minha mas ilustra onde quero chegar, parece-me óbvio que ‘a figura do diretor está talhada para falar grosso para baixo e fininho para cima'. O diretor da escola é colocado no meio de uma cadeia de comando para controlar aqueles que estarão, teoricamente, [abaixo], na sua lógica de organização, mas que para cima responde timidamente porque não tem poder e tem de obedecer a orientações. Portanto, a escola que devemos lutar para ter não pode estar assente numa lógica de um diretor a mandar naquele universo todo. Mas é isto que este e os últimos governos têm feito.

Atividade sindical

E: Referiu no discurso de abertura ao congresso que a atividade sindical já não se faz à luz do estipulado pela Constituição da República, em que ponto está?

AM: Num ponto muito baixo relativamente ao respeito dos direitos constitucionais. Na Constituição, há uma lógica de valorização do trabalho sindical. Mas hoje os sindicatos são olhados num plano de desvalorização do seu papel na sociedade. Vivemos com mais dificuldades para alimentar a relação de proximidade das escolas porque isso não se consegue quando não há dirigentes disponíveis para o fazer. E cada vez há menos.

E: Refere-se aos cortes no número de dirigentes?

AM: Os cortes no exercício da atividade sindical são constantes. O Governo não só agiu no sentido de diminuir a capacidade de reação dos sindicatos e das suas direções, como também do exercício do direito de atividade sindical que cada professor tem. Dificultando, por exemplo, a participação em reuniões.

"Portanto, há uma ofensiva dirigida a enfraquecer ao máximo o trabalho dos sindicatos. "

E: Como assim?

AM: Um professor não pode participar numa reunião fora da sua escola. O princípio consagrado de destinar ao longo do ano alguns tempos para o professor poder faltar para participar em reuniões, hoje só o pode fazer, se estas forem na sua escola. Se for na escola ao lado já não dá. Portanto, se os professores só conseguem obter tempos para se juntarem nas suas escolas, é necessário que haja dirigentes que possam alimentar essas reuniões. Mas não os há porque também foram reduzidos.

Portanto, há uma ofensiva dirigida a enfraquecer ao máximo o trabalho dos sindicatos. Vivendo nisto, vamos adaptando as circunstâncias do nosso trabalho à realidade de cada ano. Mas se a ideia [do Governo] é desta maneira forçar os sindicatos a não ter atividade, está enganado. Vai haver atividade, mesmo nas piores circunstâncias.

E: Disse no seu discurso "tanto mais militante será a ação quanto mais apertado o cerco à nossa volta"...

AM: Se nos estão a criar cada vez mais dificuldades, só temos de reagir com uma ação militante. No sentido de perceber em que condições vamos ter de trabalhar, sacrificando mais algum do nosso tempo que poderia ser destinado a outras coisas. Desde o início do ano letivo, em setembro, até fevereiro, metade dos sábados para muitos de nós foram ocupados com trabalho sindical. A afirmação da militância passa por aqui.

E: Há muitos professores a deixarem de pertencer ao sindicato?

AM: A dessindicalização tem aparecido com alguma dimensão, não tão grande como poderia ser, em virtude dos cortes salariais que aconteceram. Há quem olhe para o seu orçamento mensal e veja que tem de abdicar de alguma coisa, então escolhe a quota sindical.

"A dessindicalização é uma dificuldade acrescida que temos de saber enquadrar para trabalhar com ela e tentar evitá-la."

E: Que é apenas de 1% do vencimento.

AM: Esse 1% de quota pode justificar que uns mantenham o vínculo e outros dispensem o sindicato. No entanto, a dimensão da dessindicalização não causa nenhum alarmismo, mas a maioria das justificações vêm do plano económico.

A dessindicalização é uma dificuldade acrescida que temos de saber enquadrar para trabalhar com ela e tentar evitá-la. Os sindicatos só vivem das suas quotizações. Mas a vinculação ao sindicato passa também pelo tempo que lhe é dedicado e que está completamente reduzido. Por exemplo, quando as reuniões [sindicais] acontecem na escola, o professor não vai se isso implicar faltar a alguma aula. Todas estas pressões sobre os professores condicionam o trabalho sindical.

E não é por acaso que algumas das jornadas de luta da Federação Nacional de Professores estão marcadas para os sábados, a próxima a 12 de março. A CGTP tem também uma ação marcada para 19 de março. Os trabalhadores têm de saber contornar estas dificuldades.

E: Que motivos tem um professor para se sindicalizar?

AM: Publicamos um desdobrável com um texto do John Dewey [Porque sou membro do sindicato dos professores] que tem largas dezenas de anos e é situado nos EUA, em que ele, naqueles contextos, tenta demonstrar como é importante estar-se ligado a um sindicato e como para ele é impensável não se estar. Há que justificar porque não se está e não encontrar justificações para se estar filiado num sindicato.

Este texto tem uma grande intencionalidade política, mas mostra sobretudo a importância do espaço sindical, seja de que ramo for. Por isso, é importante dizer aos professores que se liguem aos sindicatos, mesmo àqueles que pensam ser complicado para o seu orçamento dar 1% de quotização mensal. Vale a pena pertencer a uma organização que os represente.

E: Notaram acréscimo de sindicalizados provenientes do ensino particular e cooperativo, depois da polémica dos contratos de associação?

AM: Esse era um setor com algumas debilidades de sindicalização. Havia quem se retraísse devido à relação patronal estabelecida, mas neste momento temos notado que os professores do ensino particular e cooperativo perceberam a importância de terem um sindicato ao seu lado. Até porque os problemas chegaram a este setor de uma forma evidente pelo que a relação com o sindicato atualiza-se, em alguns casos exerce-se pela primeira vez...

E: E têm feito reuniões abertas aos não sindicalizados do setor privado?

AM: Claro. Desde sempre, essa foi uma prática do SPN. Mas por força desta repressão sobre o exercício do trabalho sindical, tivemos que limitar a alguns níveis a ligação com os professores à condição de ser sindicalizado ou não. Foi uma coisa que nos custou, porque antes não o fazíamos, recebíamos os professores independentemente de serem sócios ou não. Mas agora os recursos estão tão limitados que, se continuássemos a distribuí-los igualmente, eventualmente estaríamos a servir mal os sócios."

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Abraço!

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