sexta-feira, 22 de abril de 2011

Krugman e a educação

"Assim, se quisermos uma sociedade em que a prosperidade é amplamente partilhada, a educação não é a resposta – teremos de construir essa sociedade directamente, pelas nossas mãos."

É um extracto deste artigo de opinião de Luís Malheiro, no jornal da Madeira.

Numa altura em que se tem falado muito da importância da Educação para o desenvolvimento do país, surge esta perspectiva, que não queria afirmar ser contrária, apenas útil para reflectirmos mais e melhor.

É verdade que não é um curso superior que nos garante o emprego, mas a Educação é fundamental. Possivelmente um curso profissional numa escola de secundária ou de formação pode ser mais vantajoso do que um curso universitário para um vasto leque de jovens/adultos: saem mais cedo para o mercado de trabalho (logo ganham mais experiência e recebem salário mais cedo, não tendo gastos com a continuação dos estudos), ganham mais experiência no terreno (em oposição às "teorias" das aulas), podem ter um emprego mais estável mais cedo e assim pensar em construir família também mais cedo, entre outras vantagens.

Não me alongo mais (sei que esta questão foi só aflorada, muito há para dizer, mas dêm a vossa opinião e posso lançar uma nova menssagem mais direccionada para as conclusões a que chegarmos) e deixo-vos o texto integral:


"Estamos em época de Páscoa, de férias escolares, de feriados e tolerâncias de ponto – criticadas por alguns por poderem constituir um mau exemplo dos negociadores da “troika” que em Portugal estudam a forma como nos vão passar a corda pelo pescoço e a intensidade do respectivo nó…. – pelo que o tema da educação, particularmente depois de indicadores da OCDE pouco favoráveis, parece-me constituir uma ideia de reflexão recomendável.
Mas em vez de perorar ou de inventar, sujeitando-me ao julgamento fundamentalista do sector – ainda por cima sendo eu um “outsider” – nada melhor que usar um texto opinativo de quem acredito saber do que escreve. Refiro-me a Paul Krugmam, docente universitário, investigador, economista e Prémio Nobel da Economia. Já sei! Para alguns um “tonto” que não percebe patavina do assunto. Sim, porque em Portugal falar de educação é falar de sindicalistas, já que fico muitas vezes com a ideia de que só eles é que sabem do que falam, só eles conhecem os problemas do sector, só eles são capazes de dar a volta aos obstáculos que afectam a educação de uma maneira geral, e que na minha opinião, não começam na escola, nem nas decisões tomadas pelos governantes (também…), mas na mentalidade social, na educação que as pessoas adquirem nos seus meios familiares, na forma como a sociedade valoriza a educação na perspectiva de mais-valia para quem a frequenta, na postura dos pais relativamente aos filhos no que à educação diz respeito. Contento-me com a alusão ao facto de se tratar “só” de um Prémio Nobel (2008), com tudo o que isso implica.
Com a devida vénia utilizarei o texto, intitulado “A educação não é a chave do sucesso económico”, publicado no Jornal I onde aquele economista reputado é articulista, dele extraindo algumas das ideias essenciais de uma filosofia que, no caso do nosso país, muito raramente alguém ousaria utilizar. A minha ideia é apenas deixar algumas ideias para reflexão as quais, apesar de terem os EUA como pano de fundo, acabam por ser as mesmas noutras latitudes:
“A ideia de que a educação é a chave do sucesso económico é aceite por toda a gente; todos concordam que os empregos do futuro vão exigir um maior grau de qualificação. Foi por isso que, numa aparição pública na última sexta-feira com o antigo governador da Florida Jeb Bush, o presidente Barack Obama declarou que, "se quisermos melhores notícias na frente do emprego, temos de investir mais na educação". Só que toda a gente está enganada. No dia a seguir ao do evento Obama-Bush, o "The Times" publicou um artigo acerca do uso crescente de software em pesquisas de natureza jurídica. Acontece que os computadores podem analisar rapidamente milhares de documentos, desempenhando por um custo baixíssimo uma tarefa que antigamente exigia verdadeiros exércitos de advogados.

A investigação jurídica não é um exemplo isolado. Como o artigo indica, o software também está a substituir os engenheiros em tarefas como a concepção de novos chips. De uma maneira mais geral, a ideia de que a tecnologia moderna elimina apenas empregos pouco qualificados, de que as pessoas com formação académica sofisticada não têm nada com que se preocupar, pode dominar a imprensa popular mas é claramente anacrónica – várias décadas. A realidade é que desde o início dos anos 90, mais ou menos, o mercado de trabalho dos Estados Unidos se tem caracterizado não por um aumento generalizado de competências, mas por um fenómeno diferente: tanto os empregos muito bem como muito mal pagos têm crescido imensamente, mas não os de remuneração média – aqueles com que contamos para alimentar uma classe média forte –, que têm ficado claramente para trás. E o fosso está a alargar-se: muitas das ocupações que cresceram de forma rápida nos anos 90 têm crescido de forma mais lenta nos últimos anos, ao mesmo tempo que o emprego mal pago e pouco qualificado tem aumentado.
Por que razão está isto a acontecer? A ideia de que a formação académica se está a tornar cada vez mais importante assenta na noção aparentemente razoável de que os avanços da tecnologia aumentam as oportunidades de emprego para aqueles que trabalham com informação – em sentido lato, que os computadores favorecem aqueles que trabalham com a mente, prejudicando os que fazem trabalho manual (…)
A maior parte do trabalho manual que ainda não desapareceu na economia norte-americana é do tipo que é difícil de automatizar. Numa altura em que a força de trabalho em linhas de montagem nos Estados Unidos está reduzida a 6% da população activa, já não há muitos empregos deste tipo que possam ser eliminados. No entanto, muitos trabalhos de pessoas com formação e relativamente bem pagos podem vir a ser informatizados em breve. Os robôs domésticos são engraçados, mas os empregados domésticos ainda estão longe de passar à história; a investigação jurídica computorizada e o diagnóstico médico com ajuda computacional também já existem.
E depois há a globalização. Em tempos só os operários tinham de se preocupar com a concorrência dos operários de outros países, mas a combinação entre informática e telecomunicações tornou possível transferir muitos trabalhos para outros países. A pesquisa dos meus colegas da Universidade de Princeton Alan Blinder e Alan Krueger sugere que os trabalhos altamente qualificados e muito bem pagos são, em certo sentido, mais facilmente deslocalizáveis que os menos qualificados e mais mal pagos. Se eles tiverem razão, o crescimento do comércio internacional de serviços vai afectar ainda mais o mercado de trabalho norte-americano.
De que maneira é que isto afecta a educação nos Estados Unidos? É um facto que temos um problema com a educação. O mais preocupante são as desigualdades à partida – as crianças inteligentes de famílias pobres têm menos probabilidades de concluir a faculdade que crianças muito menos inteligentes de meios mais ricos. Isto não só é escandaloso como representa um desperdício imenso do potencial humano do país. Mesmo assim, há coisas que a educação não tem capacidade de fazer. A ideia de que mandar mais jovens para a universidade poderia recuperar a nossa classe média é pura fantasia. Se hoje já não se pode dizer que um curso universitário assegura um bom emprego, a cada nova década isso vai sendo mais evidente.
Assim, se quisermos uma sociedade em que a prosperidade é amplamente partilhada, a educação não é a resposta – teremos de construir essa sociedade directamente, pelas nossas mãos. Temos de devolver à força de trabalho o poder negocial que ele perdeu ao longo dos últimos 30 anos, de maneira que tanto um vulgar operário como uma superestrela possam exigir bons salários. Temos de garantir os direitos essenciais a todos os cidadãos, em especial o direito à saúde. O que não podemos é chegar onde queremos distribuindo mais formação universitária a torto e a direito. Podemos estar apenas a vender bilhetes para empregos que já não existem, ou então que não asseguram salários de classe média”.
Não me digam que o homem não tem razão?!..."




Abraço!

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