Ou será que sabem quase nada e temos que ir descobrindo o que sabem?
E se soubermos o que ele tem que saber (um 20, na componente cognitiva - não se esqueçam do resto - não é para um aluno perfeito, é para um aluno que sabe tudo o que é necessário saber para determinado teste ou prova) e partirmos daí?
Certamente ainda conhecem e/ou aplicam outro método...
| ||||||
Creio que foi em 1960 que eu compreendi a diferença que havia entre classificar um aluno de 0 a 20 ou de 20 a 0. Eu explico-me. Naquele ano, eu prestava serviço de exames num liceu do Porto e integrava um júri de provas orais do 5.º ano dos liceus. O 5.º ano que estava dividido em duas secções: a de Letras e a de Ciências. A secção de Letras tinha quatro disciplinas: Português, Francês, Inglês e História. Como a dispensa das provas orais só era possível com a média de 16 valores, a maioria dos alunos acabavam por ter de as realizar. Ora, nessa manhã, tínhamos um caso interessante, o de um aluno que tinha dispensado em Ciências com 17 valores e que vinha à oral de Letras com 15 valores. Com uma nota fraca em Português, boas notas em línguas estrangeiras e uma classificação excecional em História: 19,6 - enfim, um 20! E era exatamente pela História que ele ia começar. O examinador, um professor de outra época à beira da reforma, antes de começar a sua interrogação, folheara a prova escrita, sorrira-se e passara-ma para a mão: 'Não foi o colega que corrigiu esta prova, pois não?' Perante a minha negativa, adiantou-se um pouco mais: 'Francamente, darem 20 valores a um aluno... Se quiser dar uma vista de olhos, talvez chegue à mesma conclusão a que eu cheguei.' Como eu era de História (embora estivesse a examinar Português), não achei estranha a sua sugestão. A prova pareceu-me impecável, pelo que não via razão para tanto espanto. Quando lhe ia dar a minha opinião, o presidente do júri chamou o dito aluno, pelo que não tive tempo de dizer o que pensava. E começou o interrogatório: cerradíssimo, na busca dos pontos fracos do examinando. Quando lhe mandou escrever no quadro uma cronologia de reis, rainhas, príncipes e colaterais, convenci-me que estávamos perante um ato de terrorismo pedagógico... O aluno, evidentemente, ignorava alguns dos elos de linhagens tão ilustres e disse-o: 'Isso não sei, senhor doutor, nunca me ensinaram, nem encontrei nos livros por onde estudei.' O meu colega exultava: 'Ai, não sabe? Admira-me, para quem teve 20 valores...' Foi nesse momento que eu percebi o que era um exame para esse professor (e para a maioria com os quais eu sempre contactara): um processo de inquirição, numa procura sistemática do erro. O aluno iniciava a prova em estado de graça, ou seja, a valer 20; a função do professor era ir descobrindo o que ele não sabia, a fim de ir descontando - uma espécie de expulsão do Paraíso daquele que pecou... Com tudo isto a perturbar-me, tive de interrogar o candidato, em Português, no dia seguinte. De facto, aí, os seus conhecimentos eram diminutos, pelo que tive de o valorizar, de o reforçar, a fim de que ele se fosse aguentando na esfera das notas positivas. Quando acabei, o professor de História não se conteve: 'O colega é muito benevolente. Qualquer coisinha que ele dissesse, para si, já estava bem...' Sorri, comentei: 'Pois é, talvez seja porque não tenho a sua experiência...'. Pareceu-me hesitar na interpretação a dar às minhas palavras, mas nada mais acrescentou. Ele tinha razão: eu partia do princípio que o aluno entrava na prova a valer 0 (no caso presente, 8 valores) e, pouco a pouco, eu ia tentando ver o que sabia. Eu não tirava, acrescentava. E não serão estes os dois modos de estar na vida, em que todos nós nos situamos? Talvez mais a 'descontar' do que a 'contar', talvez mais a 'julgar' do que a 'valorizar'. Talvez." Abraço! |
Sem comentários:
Enviar um comentário
Porque me interessam outras opiniões! Tentarei ser rápido a moderar o que for escrito, para poder ser publicado.