"Plano Tecnológico. Estado gastou 14 milhões para prestar assistência que escolas não usam
Docentes consideram o centro de apoio tecnológico lento e burocrático e optam por sobrecarregar o seu horário de trabalho para gerir o parque informático das escolas
Mais de 900 escolas públicas têm tudo o que é tecnologia de ponta – um computador para cada dois alunos, quadros inte-ractivos em cada sala de aula, retroprojectores, banda larga e internet nas salas de aulas. Entre 2008 e 2010, o Estado gastou 400 milhões de euros com o Plano Tecnológico da Educação (PTE). Agora que 75% das escolas portuguesas estão apetrechadas com o equipamento mais avançado da Europa há um problema que se levanta: o anterior governo retirou o tempo lectivo às equipas de professores que faziam a gestão e a manutenção do parque informático. Resta saber quem vai desempenhar essa tarefa nos estabelecimentos do ensino secundário e ainda dos 2.o e 3.o ciclos.
A resposta até poderia ser simples. O governo de José Sócrates pensou nisso e criou o Centro de Apoio Tecnológico às Escolas (CATE), com uma dupla finalidade: assegurar a manutenção do parque informático nos estabelecimentos de ensino e ainda desembaraçar os professores dessa responsabilidade, para que pudessem centrar toda a atenção nas aulas e no ensino.
O projecto custou 14,6 milhões de euros e começou a funcionar este ano lectivo. Só que boa parte das escolas não usa o serviço por o considerar lento e burocrático. Boa parte das escolas tem de depender agora do voluntarismo dos professores para manter as máquinas a funcionar sem falhas nem anomalias. “O CATE para nós não existe. É pouco ágil, implica enviar e reenviar emails, aguardar a resposta e as escolas não podem dar-se ao luxo de esperar esse tempo, porque quase tudo está dependente da rede informática”, explica José Alberto Ramos, director da Secundária Gonçalves Zarco, em Matosinhos. José Nogueira, professor e coordenador do PTE no agrupamento Ibn Mucana, em Cascais, também não fica à espera que lhe resolvam os problemas. De cada vez que surgiu uma anomalia na rede informática ou num computador da escola sede do agrupamento, contactou o CATE. Enviou um email com o relatório da avaria e a informação seguiu o seu percurso interno até ser devolvido ao coordenador do PTE com a indicação de que tudo estaria resolvido. Só que a anomalia persistiu.
José Nogueira repetiu o processo e voltou a fracassar. Prometeram-lhe então assistência presencial, perante algumas condições – depois das 18 horas, quando a escola está fechada, e na presença de um dos professores que integram a equipa. “Ao fim de duas ou três experiências destas desisti de recorrer ao centro e somos nós que fazemos a intervenção quando é possível”, conta.
Recorrer aos professores da escola é a única solução, até porque – esclarece a directora do agrupamento, Teresa Lopes – a escola não se compadece com as “listas de espera” do CATE, pois todos os serviços dependem da rede informática: “Estas questões têm de ser tratadas com urgência e com eficácia, daí necessitarmos de assistência disponível no momento e no local.”
SERVIÇO DUPLICADO. Há escolas que continuam a manter contratos de manutenção com outras empresas, apesar de o CATE ter sido criado para suprir essa necessidade. É o caso dos agrupamentos da Apelação (Loures) ou de São Julião da Barra, em Oeiras. O modelo de gestão do parque informático é semelhante nas duas escolas-sede. As anomalias “mais complicadas” são resolvidas com recurso a uma empresa e a manutenção do equipamento é feita por professores com experiência na área: “O tempo lectivo que os docentes têm para essa tarefa é mínimo, logo é por voluntarismo que asseguram esse serviço”, conta Félix Bolaños, director das escolas da Apelação.
Na Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho, em Lisboa, ou na Secundária Severim de Faria, em Évora, o esquema repete-se. Direcção e professores reorganizaram-se internamente para não terem de depender do CATE. Por enquanto a solução funciona, embora seja difícil perceber porque é que o Estado gastou 14 milhões de euros para criar um serviço que boa parte das escolas não usam e nem sequer cumprem o objectivo de aliviar a carga horária dos professores, que têm agora de trabalhar horas extra e não remuneradas para manter o PTE.
“É bonito ter as escolas com computadores, internet, videovigilância e outras tecnologias, mas, se não é possível assegurar a sua manutenção, seria preferível ter menos”, censura Carlos Percheiro, da Secundária Severim de Faria.
O director da escola de Évora está convencido de que o único caminho para garantir o bom funcionamento do parque informático escolar passa por a tutela pôr técnicos a trabalhar “três ou quatro horas semanais” em cada escola com flexibilidade para responder prontamente aos casos de emergência com que os estabelecimentos de ensino se deparam frequentemente: “Os professores não devem ser missionários. Não se pode despejar tudo em cima deles, esperando que resolvam tudo à custa do seu voluntarismo. Caso contrário, vamos estar muito mal a curto prazo.”
Jornal i
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