J. A. Pinto de Matos
A imagem romântica do professor, ligada ao status da sabedoria e ao seu reconhecimento pela comunidade, que permitia uma sã convivência e integração social, está ultrapassada e enferma duma contínua desvalorização, desde há algumas décadas.
A depreciação social e a forma como se desenvolve o trabalho dos professores afetam o seu bem-estar e a sua saúde, como concluem muitos estudos: é causadora de stress, da síndrome de burnout, do mal-estar docente e de outros distúrbios.
Reconhecendo-o também, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) considera a profissão docente, desde 1981, uma profissão de risco. Mas há outros riscos de que enferma: com alguma frequência os professores são enxovalhados (com termos ou apelidos depreciativos e palavras de baixo nível) e vítimas de atos de vandalismo (danos nas viaturas, nas roupas, etc.); em situações mais extremas, são mesmo agredidos fisicamente por alunos e/ou amigos e encarregados de educação.
Não nos alonguemos mais no elencar destes problemas, uma realidade que os professores bem conhecem, mas que a sociedade e as autoridades continuam a desvalorizar, porque quem sofre até aos limites do estoicismo, em Portugal, corre o risco de ser apelidado de piegas (por quem seguir a cartilha do senhor Primeiro Ministro).
As agressões verbais e os atos de vandalismo contra os professores são mais comuns do que as agressões físicas, mas, de vez em quando, a comunicação social faz eco de ocorrências graves deste tipo. No dia 31 de Janeiro, um professor de matemática de 63 anos, foi agredido, a murros e pontapés, à frente da sua escola, por três alegados familiares de uma aluna que expulsou da sala de aula, por estar a perturbar as atividades da aula.
O sofrimento adveniente não é só físico: uma vida profissional, já no seu ocaso, assim de algum modo posta em causa (é assim que os professores também interiorizam estas ocorrências) deixa mazelas físicas, mas também emocionais: o professor continua de baixa psiquiátrica. No entretanto, o inquérito, segundo a Lusa, aguarda por despacho da magistrada do Ministério Público.
A sociedade e os seus representantes deveriam de imediato posicionar-se, deveriam colocar-se do lado do professor que, dessa forma, procurava garantir aos outros alunos da turma o direito que tinham à aula e que, com o comportamento da colega, estaria a ser posto em causa. Mas nem sempre o posicionamento é claro e raras vezes a solidariedade parece sincera. Deprecia-se e esquece-se facilmente estes (e outros) atos de violência contra os professores.
No entanto, enquanto os holofotes da comunicação social permitem alguma visibilidade, na área do governo ou da oposição, logo aparecem os magos da praça pública, arautos detentores do saber necessário para resolverem o problema que, a seus olhos, ninguém ainda tinha vislumbrado.
Alçam a voz, em discursos inflamados, na ânsia de serem os primeiros a dar o seu palpite ou a milagrosa solução, ainda que sejam inócuos ou completos disparates, como essa de propor que os professores tivessem poderes policiais. A função docente alicerça-se no saber e na pedagogia, deviam sabê-lo, por elementar. Exige-se mais ponderação nas propostas, ou, como sempre ouvi dizer, calados não diriam asneiras (embora perdessem a oportunidade de aparecer...).
Do Ministério da Educação e Ciência (MEC) ficámos a saber que condena “veementemente este tipo de comportamentos” e que são totalmente inadmissíveis e intoleráveis agressões verbais e físicas a professores, funcionários ou alunos. É pouco. Muito pouco. Do MEC (e do governo) exige-se que adote políticas que cerceiem, na génese, este tipo de comportamentos, políticas proativas, a médio e longo prazo, que visem uma efetiva inclusão social e a redução da marginalidade e da pobreza, e que não seja arrastado para posições / soluções casuísticas, eminentemente reativas.
Focalizar a educação básica apenas em “conteúdos essenciais” é uma orientação que não ajuda muito a debelar este tipo de ocorrências. A abolição da Formação Cívica do currículo escolar do ensino básico é um exemplo eloquente dessa (des)orientação.
“Gastar” uma hora por semana para, entre outro tipo de ações de foro cívico, estabelecer os limites entre o que é aceitável e o que ultrapassa essa condição, não é perder tempo, é investir para (seguramente) ganhar. Quando os jovens (e seus agregados) estão familiarizados com a agressividade e a violência, quando as vivem no seu quotidiano, tendem a considerá-las 'normais'.
Nesta desconformidade social, se não for considerado também “essencial” a escola reorientar os comportamentos dos alunos, num tempo específico, (para não usurpar o tempo daquilo que o MEC considera “essencial”), os atos de indisciplina e violência continuarão a ser relativizados no que ao seu valor de transgressão diz respeito, porque são arbitrados pela noção de justo ou injusto, certo ou errado do próprio aluno, ou mesmo da sua família. Quem sai desautorizado é o professor e a própria escola, pois é muito frequente que os alunos atuem assim com naturalidade, sem sentimento de infração, pois os princípios da ética ou da boa educação, são os que eles próprios urdiram, e não aqueles que estão estatuídos na escola e na sociedade."
Correio do Minho
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