Um texto "afiado" mas que pode ter alguma verdade sobre o financiamento das Escolas no futuro...
"Escola lugar de publicidade e felicidade
José A. Quaresma (Expresso)
A salvação do ensino está no marketing. Sem conta, peso e medida, já que estes predicados são do foro interno da escola, nomeadamente nas disciplinas de Matemática e Física.
Há uns dias, um membro da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia (SPO) alertou para a situação de médicos desta especialidade estarem a atender, nos seus consultórios, cada vez mais crianças que usam óculos sem deles terem necessidade, por recomendação das empresas ópticas que fazem rastreio nas escolas.
O oftalmologista condenou as "técnicas agressivas de marketing" utilizadas por algumas ópticas que entram escolas adentro para fazerem testes aos alunos. Até há pouco julgava que só o professor tinha competência para fazer testes na escola. Os tempos mudam e ainda bem.
A SPO não está a ver a situação. Se uma clarividente direcção da escola acha que um técnico de optometria ou um oculista estão habilitados para descobrir, num aluno, astigmatismo, miopia, estrabismo, e pô-lo a usar cangalhas para ver o que antes não via, e passar a ver pior, só revela antevisão e boa visão do problema.
Toda a acuidade visual é pouca para combater os elevados níveis de iliteracia na escola e na sociedade. Neste sentido, as preocupações das ópticas são justas. E as direcções das escolas, que permitem a sua acção, visionárias. Se a escola não consegue graduar de forma conveniente os alunos, venha quem saiba graduar-lhes a vista.
Vejo sempre, com bons olhos, a inovação a penetrar na escola. Se os alunos vêem o professor desfocado, permita-se o enfoque no aparelho optométrico. Se os alunos não vêem o docente a três dimensões, nem em dimensão alguma, prescrevam-se óculos 3D.
É importante alargar o conceito a outras perturbações do desenvolvimento discente. Se um aluno ouve mal, ou não consegue mesmo ouvir o que o professor diz, convoque-se para competente rastreio qualquer empresa de audiometria. Se um aluno dá gritos lancinantes na aula, se desata na galhofa alarve e estridente, chame-se o fabricante de Halls mentholyptus, ou o Dr. Bayard, empresas que no marketing, contemporâneo ou arcaico, da garganta têm provas dadas. Se o aluno se mexe muito, não consegue estar quieto, chamem-se ervanárias, farmácias, o professor Bambo, tarólogos, bruxos, quiromantes, a santa da Ladeira, gente qualificada que a há e muita no país para resolver os casos bicudos do sistema educativo.
A salvação do ensino está no marketing. Sem conta, peso e medida, já que estes predicados é do foro interno da praxis docente e da escola, nomeadamente das disciplinas de Matemática e Física.
Ouse-se colocar painéis publicitários em todas as salas de aula, no refeitório, na biblioteca, no pavilhão de Educação Física. Espalhem-se ecrãs multimédia por todo lado, nomeadamente pelas casas de banho onde qualquer aluno está muito desacompanhado.
Invista-se em marketing e publicidade. É a melhor forma de financiar o ensino que, como sabemos, é altamente deficitário. E de resolver o crónico défice cognitivo e comportamental de quem por lá anda.
E, sobretudo, permita-se arrecadar uns milhões de euros para a Parque Escolar acabar o trabalho de renovação das escolas, comprar uns lustres assinados pelo Siza Vieira, pelo Renzo Piano ou pela Aghata Ruiz de la Prada, e fazer de cada escola um lugar de felicidade, perdão, de publicidade, onde docentes, discentes, auxiliares de educação, viverão felizes para sempre. Ou, pelo menos, enquanto durar um spot."
Abraço!
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